quinta-feira, 12 de novembro de 2015

BRASILEIRO USA SATÉLITE DA NASA PARA ESTUDAR SECA NA REGIÃO SUDESTE

Brasília, 9 de novembro de 2015 – O Sudeste perdeu 56 trilhões de litros de água por ano desde o início da seca que atinge a região, em 2012. É como se, a cada 12 meses, evaporassem duas represas de Itaipu ou 43 sistemas Cantareira, o principal reservatório da região metropolitana de São Paulo.
A conclusão está em um estudo feito com auxílio de satélite pelo pesquisador brasileiro Augusto Getirana, da Agência Espacial Norte-americana (Nasa). O trabalho, já disponível na internet, deve ser publicado em breve no jornal da Sociedade Americana de Meteorologia.
No Nordeste, a situação também é crítica, segundo o estudo. Por ano, foram perdidos 49 trilhões de litros de água. As duas regiões enfrentam a pior seca dos últimos 35 anos, de acordo com o pesquisador, mas o fenômeno pode ser ainda mais raro, já que a Nasa só contabiliza esse tipo de dado desde 1980. Com informações sobre desde a década de 1930, a Companhia de Abastecimento de Água de São Paulo (Sabesp) afirma que o estado enfrenta a pior temporada de falta de chuva dos últimos 83 anos.
No estudo, denominado “Déficit de água extremo no Brasil detectado do espaço”, Getirana afirma que as “razões para as precipitações recentes abaixo da média (na região leste do Brasil) ainda são desconhecidas”. O pesquisador afirma que há especulações no meio acadêmico de que a escassez de chuva pode ser causada pelo aquecimento global, pelo desmatamento na Amazônia ou outros fenômenos climáticos. Segundo o texto, porém, “futuros estudos para investigar as causas são recomendados”.
“Minha intenção não era descobrir a causa da seca. Era chegar a um valor que quantificasse o tamanho dessa seca no Brasil. E a conclusão é que a situação é muito grave”, disse Getirana. “Sei que talvez seja meio tarde para dar um alerta sobre a seca em todo o leste, mas acho que essa pesquisa pode ajudar as pessoas a terem uma visão mais geral do problema”, complementa.
Para chegar ao resultado, Getirana utilizou dados colhidos pelos satélites Grace (sigla em inglês para Recuperação de Gravidade e Experimento Climático), lançados pela Nasa em 2002. Os equipamentos foram projetados para calcular variações gravitacionais da Terra por meio da análise da quantidade de água reservada em certas áreas. Eles são capazes de medir quanta água há disponível na atmosfera, superfície e no subsolo de determinada região. Também podem mostrar, em centímetros, a variação de um mês para outro.
Secas – O hidrólogo brasileiro comparou os resultados medidos mensalmente pelo Grace no Sudeste e no Nordeste com as médias de alteração no volume de água nas duas regiões nos últimos 13 anos – a última medição foi feita em abril deste ano. Também foram levados em consideração chuva, escoamento de água e umidade do solo. Analisando apenas o período medido pelos satélites, os índices de precipitação do Sudeste foram 16% mais baixos que a média. No Nordeste, foram 19% menores.
No período, porém, as duas regiões enfrentaram outra seca de grandes proporções, que provocou racionamento de energia entre 2001 e 2002 e, segundo os dados da Nasa, só terminou entre janeiro e fevereiro de 2004.
“Outra coisa que chamou a atenção ao analisar os dados do Grace é que em um período de pouco mais de dez anos essa região leste do Brasil enfrentou dois fenômenos graves de falta d’água. No Nordeste a situação é crítica porque, embora a perda de água seja menor que no Sudeste, é uma região que já era naturalmente mais seca” diz Getirana.
A previsão para chuva nos próximos meses não parece ser suficiente para reverter à tendência de perda d’água, segundo especialistas. A chuva deve ficar abaixo da média no Nordeste, de acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Especiais (Inpe). A previsão para São Paulo é que a taxa de precipitação fique dentro da média entre outubro e janeiro. No restante do Sudeste, diz o último relatório do Inpe, os “modelos numéricos apresentam baixa confiabilidade na previsão”.
O consenso entre os meteorologistas do Inpe é que período chuvoso deve começar mais tarde que o normal na região central do país este ano. Em geral, a estação chuvosa vai de outubro a abril. De acordo com meteorologistas, não é possível calcular se a quantidade de chuva prevista é suficiente para reverter as perdas identificadas no estudo.
Esta foi a primeira vez que dados do Grace foram utilizados para avaliar a situação climática no Brasil. Estudos semelhantes já haviam sido feitos para tentar entender fenômenos climáticos em Índia, Groenlândia e Estados Unidos. Uma análise preliminar feita por Getirana mostra que a seca no Sudeste do Brasil é pior, inclusive, do que a observada na Califórnia, estado americano que enfrenta uma seca severa nos últimos anos.
“O satélite sempre mostra o passado, e não a situação atual da região pesquisada. Agora, por exemplo, temos acesso a dados que foram recolhidos em abril último. Os resultados podem servir para melhorarmos os modelos matemáticos que fazem previsões meteorológicas. E isso pode ser usado por governos e agências para influenciar tomadas de decisão”, afirma o pesquisador.
Trajetória – Formado em Engenharia Civil pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Getirana trabalha na Nasa há três anos e tem vínculo com a agência espacial americana por mais quatro anos. Ele estuda água há muito tempo. Fez mestrado e parte do doutorado no Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe/UFRJ) – outra parte do doutorado foi feita na França.
Em 2010, recebeu um prêmio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) por tese sobre o ciclo da água na Amazônia. Getirana foi para a Nasa para um pós-doutorado e hoje trabalha com modelos matemáticos para eventos climáticos extremos, como secas e enchentes. Antes, trabalhou na agência espacial e no serviço de meteorologia da França.
Fonte: O Globo

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